sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

PRINCÍPIOS DO COMUNISMO (continuação)



XVIII - Que caminho seguirá essa revolução?
Antes de mais nada, estabelecerá uma Constituição democrática e portanto, direta ou indiretamente, a dominação política do proletariado. Diretamente na Inglaterra, onde os proletários já são a maioria do povo. Indiretamente na França e na Alemanha, onde a maioria do povo não é composta só de proletários, mas também de pequenos camponeses e pequenos burgueses, que apenas agora se encontram na fase de transição ao proletariado e que, no que se refere aos seus interesses políticos, dependem cada vez mais do proletariado, razão pela qual acabarão por aderir às reivindicações do proletariado. Isso talvez venha a custar uma segunda luta que, entretanto, apenas poderá terminar coma vitória do proletariado.
A democracia seria inteiramente inútil ao proletariado se não fosse imediatamente empregada como meio para obter toda uma série de medidas que ataquem diretamente a propriedade privada e assegurem a existência do proletariado. As principais dessas medidas, que já resultam como conseqüências necessárias da atual situação, são:
1) Limitação da propriedade privada mediante impostos progressivos, fortes impostos sobre as heranças, supressão dos direitos hereditários em linha colateral (irmãos, sobrinhos, etc), empréstimos obrigatórios, etc.
2) Expropriação gradual dos proprietários fundiários, fabricantes, proprietários de ferrovias e armadores navais, em parte mediante a concorrência das indústrias do Estado, em parte diretamente, mediante indenização em hipotecas.
3) Confisco dos bens de todos os emigrados e de todos aqueles que se rebelarem contra a maioria do povo.
4) Organização do trabalho, ou seja, emprego dos proletários nas terras, fábricas e oficinas nacionais, o que eliminará a concorrência dos operários entre si e obrigará os fabricantes, enquanto existirem, a pagar salários tão elevados quanto os do Estado.
5) Trabalho obrigatório para todos os membros da sociedade, até a completa abolição da propriedade privada. Formação de exércitos industriais, especialmente para a agricultura.
6) Centralização do sistema de crédito e das finanças nas mãos do Estado através de um banco nacional formado com capital do Estado e interdição de todos os bancos privados e dos banqueiros.
7) Multiplicação das fábricas e oficinas nacionais, das ferrovias e dos navios; arroteamento de todas as terras e melhoramento das já arroteadas, na mesma medida em que aumentem os capitais e os operários de que disponha a nação.
8) Educação de todas as crianças a partir do instante em que possam prescindir dos cuidados maternos, em estabelecimentos nacionais e a cargo do Estado. Educação conjugada com o trabalho fabril.
9) Construção, nos terrenos nacionais, de grandes prédios que sirvam de habitação coletiva às comunidades de cidadãos que trabalhem tanto na indústria como na agricultura, reunindo assim as vantagens da vida urbana e da vida no campo, sem compartilhar a unilateralidade e os inconvenientes de ambos os modos de vida.
10) Demolição de todas as casas e de todos os bairros insalubres e mal construídos.
11) Iguais direitos hereditários tanto para os filhos legítimos quanto para os ilegítimos.
12) Concentração de todos os meios de transporte nas mãos da nação.
Todas essas medidas não poderão, evidentemente, ser implantadas de uma só vez. Mas de uma decorrerá necessariamente a outra. Realizado o primeiro ataque radical contra a propriedade privada, o proletariado ver-se-á obrigado a avançar cada vez mais, a concentrar cada vez mais nas mãos do Estado todo o capital, toda a agricultura, toda a indústria, todos os transportes e todas as trocas. É para isso que tendem todas essas medidas; elas serão realizadas e engendrarão suas conseqüências centralizadoras na mesma medida em que o trabalho do proletariado multiplicar as forças produtivas do país. Finalmente, quando todo o capital, toda a produção e todas as trocas concentrarem-se nas mãos da nação, a propriedade privada desaparecerá por si só, o dinheiro será supérfluo, a produção aumentará a tal ponto e os homens mudarão em proporções tais que poderão desaparecer também as últimas formas de relação da velha sociedade.
XIX - Essa revolução poderá ser realizada em um só país?
Não. A grande indústria, ao criar o mercado mundial, uniu todos os povos da terra, e principalmente os povos civilizados, a tal ponto que cada povo depende daquilo que ocorre com os demais. Além disso, a grande indústria nivelou em todos os países civilizados o desenvolvimento social, a tal ponto que em todos eles a burguesia e o proletariado tornaram-se as duas classes decisivas da sociedade e a luta entre essas duas classes tornou-se a principal luta de nossos dias. Por isso, a revolução comunista não será uma revolução apenas nacional, mas ocorrerá simultaneamente em todos os países civilizados, quer dizer, pelo menos na Inglaterra, na América, na França e na Alemanha. Irá se desenvolver mais rapidamente ou mais lentamente em cada um desses países, de acordo com o maior ou menor desenvolvimento da indústria, a maior ou menor acumulação de riquezas e a maior ou menor massa de forças produtivas que possua cada um deles. Assim, na Alemanha ela será mais lenta e mais difícil, enquanto que na Inglaterra será mais rápida e mais fácil. Terá grande repercussão sobre os outros países do mundo, transformará completamente e acelerará extraordinariamente o modo de desenvolvimento por eles seguido até aqui. Será uma revolução universal e terá por isso um terreno universal.
XX - Quais serão as conseqüências da eliminação definitiva da propriedade privada?
Ao despojar os capitalistas privados da utilização de todas as forças produtivas e de todos os meios de comunicação, assim como da troca e da distribuição dos produtos, ao administrar tudo isso de acordo com um plano baseado nos recursos disponíveis e nas necessidades de toda a sociedade, a própria sociedade eliminará, antes de tudo, todas as conseqüências deploráveis hoje inerentes ao funcionamento da grande indústria. As crises desaparecerão; a produção ampliada, que na atual organização da sociedade representa uma superprodução e uma poderosa causa de miséria, será então muito insuficiente e deverá ser ainda muito mais aumentada. Ao invés de engendrar a miséria, a superprodução garantirá, bem mais que as necessidades imediatas da sociedade, a satisfação das necessidades de todos e engendrará novas necessidades, bem como os meios para satisfazê-las. Desse modo, será a condição e a causa de novos progressos, e os alcançará sem levar a ordem social, como antes, a transtornos periódicos. Livre das pressões da propriedade privada, a grande indústria desenvolver-se-á em proporções diante das quais seu desenvolvimento atual parecerá tão mesquinho quanto a manufatura comparada com a grande indústria moderna. Esse desenvolvimento da indústria colocará à disposição da sociedade uma massa de produtos suficiente para satisfazer às necessidades de todos. Assim também a agricultura que, pressionada pela propriedade privada e pelo fracionamento da terra, não pode apropriar-se das melhorias e dos progressos científicos já conseguidos, alcançará um novo auge e entregará à sociedade uma quantidade suficiente de produtos. Desse modo, a sociedade criará produtos suficientes para que se possa organizar a distribuição de maneira a satisfazer as necessidades de todos os seus membros. Com isso, ficará supérflua a divisão da sociedade em diferentes classes contrapostas entre si. Tal divisão, além de supérflua, será mesmo incompatível com a nova ordem social. A existência das classes tem origem na divisão do trabalho, e a divisão do trabalho, tal como existiu até agora, desaparecerá completamente. De fato, para elevar a produção industrial e agrícola ao nível acima assinalado, não bastam apenas os meios mecânicos e químicos; devem ser também desenvolvidas, na mesma proporção, as capacidades dos homens que fazem funcionar esses meios. Assim como os camponeses e os operários manufatureiros do século passado, ao serem arrastados pela grande indústria, modificaram todo o seu modo de vida e converteram-se eles mesmos em homens completamente distintos, a exploração em comum da produção por toda a sociedade e o novo desenvolvimento da produção disso decorrente necessitarão de homens totalmente novos e os criarão. A exploração em comum da produção não pode ser realizada por homens como os de hoje, cada um dos quais está subordinado a um único ramo da produção, encadeado a ele, explorado por ele, cada um dos quais desenvolveu apenas uma de suas capacidades à custa de todas as demais e conhece apenas um ramo ou o ramo de um ramo da produção total. A própria indústria atual já está cada vez menos empregando tais homens. A indústria explorada em comum e segundo um plano, por toda a sociedade, exige homens cujas capacidades estejam desenvolvidas em todos os aspectos, homens que possam abraçar todo o sistema da produção. A divisão do trabalho, que converte um em camponês, outro em sapateiro, um terceiro em operário fabril e um quarto em especulador da bolsa, e que hoje já está minada pelas máquinas, desaparecerá portanto completamente. A educação dará aos jovens a possibilidade de percorrer rapidamente todo o sistema de produção, colocando-os em condições de se deslocarem por turnos de um para outro ramo da produção, conforme as necessidades da sociedade ou suas próprias inclinações. A educação, portanto, libertará os jovens desse caráter unilateral que a atual divisão do trabalho imprime a cada indivíduo. Desse modo, a sociedade organizada sobre as bases comunistas oferecerá a seus membros a oportunidade de empregar em todos os aspectos suas capacidades universalmente desenvolvidas. Mas com isso desaparecerão também, necessariamente, as diferentes classes. Assim, de uma parte, a sociedade organizada comunisticamente é incompatível com a existência das classes e, de outra parte, a instauração dessa sociedade oferece, por si só, os meios para abolir tais diferenças de classe.
Resulta disso que também desaparecerá o antagonismo entre cidade e campo. A exploração da agricultura e da indústria pelos mesmos homens, e não por duas classes diferentes, em si mesma já é, por razões puramente materiais, uma condição necessária da associação comunista. A dispersão pelo campo da população dedicada à agricultura e a concentração da população industrial nas grandes cidades correspondem a um estágio ainda não desenvolvido da agricultura e da indústria e são um obstáculo para todo desenvolvimento ulterior, obstáculo que hoje já se faz sentir com muita força.
A associação geral de todos os membros da sociedade para a exploração planificada e comum das forças produtivas, a extensão da produção em proporções que satisfaçam às necessidades de todos, o término da situação em que as necessidades de uns são satisfeitas às custas de outros, a destruição completa das classes e de seus antagonismos, o desenvolvimento universal das capacidades de todos os membros da sociedade mediante a eliminação da divisão do trabalho até agora existente, mediante a educação industrial, mediante a mudança de atividades, mediante a participação de todos nos bens criados por todos, mediante a fusão do campo e da cidade: serão esses os principais resultados da abolição da propriedade privada.
XXI - Que influência a organização comunista da sociedade exercerá sobre a família?
Ela transformará a relação entre os dois sexos numa relação de caráter puramente privado, que dirá respeito apenas às pessoas nela envolvidas e na qual a sociedade não terá o menor motivo para se intrometer. Isso será possível por conta de eliminação da propriedade privada e educação das crianças pela sociedade pela qual serão destruídas as bases do casamento atual, oriundas da propriedade privada: a dependência da mulher em relação ao homem, a dependência dos filhos em relação aos pais. Nisso reside igualmente a resposta à gritaria altamente moralista da burguesia contra a comunidade das mulheres. A comunidade das mulheres é uma situação totalmente ligada à sociedade burguesa e que hoje existe sob a forma de prostituição. Mas a prostituição repousa na propriedade privada e e desaparecerá com ela. Portanto, ao invés de implantar a comunidade das mulheres, a organização comunista a suprimirá.
XXII - Qual a atitude da organização comunista diante das nacionalidades existentes?
Permanece [ 2 ]
XXIII - Que atitude adotará diante das religiões existentes?
Permanece
XXIV - Qual a diferença entre comunistas e socialistas?
Os chamados socialistas dividem-se em três categorias.
A primeira delas está formada por partidários da sociedade feudal e patriarcal que foi destruída e continua a ser destruída todos os dias pela grande indústria, pelo comércio mundial e pelo produto de ambos, a sociedade burguesa. Essa classe extrai dos males da sociedade atual a conclusão de que se deve restaurar novamente a sociedade feudal e patriarcal, que estava livre desses males. Todas as suas propostas encaminham-se, direta ou indiretamente, para esse objetivo. Tal classe de socialistas reacionários, apesar de sua pretensa simpatia e das ardorosas lágrimas que derramam pela miséria do proletariado, será sempre combatida energicamente pelos comunistas, pelas seguintes razões:
a) porque aspira a algo absolutamente impossível;
b) porque procura restaurar a dominação da aristocracia, dos mestres-artesãos edos manufatureiros, com todo seu cortejo de reis absolutos ou feudais, funcionários, soldados e sacerdotes - uma sociedade que, é certo, estava livre dos males da sociedade atual, mas que, em troca continha pelo menos outros tantos males e nem sequer oferecia a perspectiva da emancipação dos operários oprimidos mediante uma organização comunista;
c) porque revela suas reais intenções toda vez que o proletariado se torna revolucionário e comunista, quando então se alia imediatamente à burguesia contra os proletários.
A segunda categoria é composta de partidários da sociedade atual, para os quais os males que ela necessariamente engendra despertam temores quanto à existência dessa própria sociedade. Tais socialistas procuram, portanto, conservar a sociedade atual, mas eliminando os males a ela inerentes. Para alcançar isso, uns propõem simples medidas de beneficência; outros, grandiosos sistemas de reformas que, a pretexto de reorganizar a sociedade, visam de fato conservar as bases da sociedade atual e, portanto, a própria sociedade atual. Esses socialistas burgueses também deverão ser continuamente combatidos pelos comunistas, pois trabalham para os inimigos dos comunistas e defendem exatamente a sociedade que os comunistas querem destruir.
Finalmente, a terceira categoria é composta dos socialistas democráticos, que procuram, pelo mesmo caminho dos comunistas, realizar uma parte das medidas enumeradas na resposta à pergunta 18, mas não como meios de transição ao comunismo e sim como medidas suficientes para abolir a miséria e fazer desaparecer os males da sociedade atual. Tais socialistas democráticos são, ou proletários ainda não suficientemente esclarecidos sobre as condições da libertação de sua classe, ou representantes da pequena burguesia, quer dizer, da classe cujos interesses, sob muitos aspectos, coincidem com os interesses dos proletários, até o momento em que se conquista a democracia e se aplicam as medidas socialistas dela derivadas. Os comunistas deverão portanto chegar a um entendimento com esses socialistas democráticos nas diferentes fases da ação e deverão em geral seguir para o momento uma política comum com eles, sempre que esses socialistas não atuarem a serviço da burguesia dominante e não atacarem os comunistas. É evidente que esse tipo de ação comum não exclui a discussão das diferenças existentes entre eles e os comunistas.
XXV - Qual é o comportamento dos comunistas diante dos demais partidos políticos de nossa época?
Essa relação varia segundo os vários países. Na Inglaterra, na França e na Bélgica, onde domina a burguesia, os comunistas ainda têm, no momento, interesses comuns com os vários partidos democráticos, interesses esses que são tanto maiores quanto mais os democratas, com as medidas socialistas por eles proclamadas em todas as partes, aproximam-se da meta dos comunistas, quer dizer, quanto mais clara e decididamente defendem os interesses do proletariado e quanto mais se apoiam no proletariado. Na Inglaterra, por exemplo, o movimento cartista, integrado por operários, está infinitamente mais próximo dos comunistas do que os pequenos burgueses democráticos ou os chamados radicais.
Na América, onde está introduzida uma Constituição democrática, os comunistas deverão apoiar o partido que deseja dirigir essa Constituição contra a burguesia e utilizá-la em proveito do proletariado, quer dizer, os reformadores agrários nacionais.
Na Suiça, os radicais, apesar de constituírem um partido muito heterogêneo, são os únicos com quem os comunistas podem se entender; e entre esses radicais, por sua vez, os mais progressistas são os dos cantões de Vaud e de Genebra.
Na Alemanha, por fim, ainda não ocorreu a luta decisiva entre a burguesia e a monarquia absoluta. E como os comunistas não podem contar com uma luta decisiva contra a burguesia antes que a burguesia domine, estão interessados em ajudar os burgueses a conquistarem o poder o mais cedo possível, para então derrubá-los o mais cedo possível. Os comunistas devem portanto tomar sempre partido dos burgueses liberais contra os governos, precavendo-se apenas de compartilhar as ilusões dos burgueses ou de confiar em suas sedutoras garantias de que a vitória da burguesia trará saudáveis conseqüências para o proletariado. As únicas vantagens que a vitória da burguesia oferecerá aos comunistas serão: a) diversas concessões que facilitarão aos comunistas a defesa, a discussão e a difusão de seus princípios e, portanto, a unificação do proletariado numa classe organizada, estreitamente unida e pronta para a luta; b) a certeza de que no dia em que caírem os governos absolutos começará a luta entre burgueses e proletários. A partir desse dia, a política partidária dos comunistas será a mesma que nos países onde já domina a burguesia.
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[ 2 ] Segundo as várias traduções em espanhol e português destes "Principios", a resposta "permanece" dada às perguntas XXII e XXIII, significa que as respostas são as mesmas que foram anteriormente expostas no "Projeto de profissão de fé comunista"

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